Uma pesquisa realizada pela Nexus —empresa especialista em inteligência de dados— revelou que 86% da população brasileira é a favor de algum tipo de restrição ao uso de celular dentro das escolas. O estudo ouviu 2.010 pessoas em todas as regiões do país, e revela que mais da metade da população (54%) é favorável à proibição total do uso dos aparelhos em escolas, enquanto outros 32% acreditam que eles devem ser permitidos apenas em atividades pedagógicas, sob supervisão dos professores.
Entre os entrevistados mais jovens, de 16 a 24 anos, 89% apoiam algum nível de restrição, ainda que menos da metade (46%) defenda a proibição total. “Nove em cada dez jovens reconhecem que o uso indiscriminado dos celulares tem atrapalhado o desempenho escolar”, aponta Marcelo Tokarski, CEO da Nexus.
Dentre os mais velhos, 32% dos acima de 60 anos e 31% dos que têm entre 25 e 40 anos preferem uma proibição parcial. Nesta última faixa etária, o percentual mais que dobra quando a opção é a proibição total, a escolha de 58% dos entrevistados. Entre os brasileiros de 41 a 59 anos, o percentual é de 27%.
A distribuição regional, por sua vez, revela variações sutis, com o apoio mais alto vindo da região Sul (93%) e o mais baixo do Sudeste (83%), ainda que ambos os índices indiquem ampla aceitação da medida.
O estudo também aponta que não há diferença de opinião entre quem convive ou não com crianças em idade escolar. “Nosso pressuposto era de que quem não tem filho, não vive com criança e adolescente, poderia estar mais distante dessa discussão. O que surpreende é que exatamente os mesmos 86% favoráveis à proibição são vistos nos dois perfis”, aponta Tokarski.
Ele lembra que o brasileiro lidera o ranking de tempo em frente às telas de smartphones e computadores. Em média, 5,6 horas segundo a pesquisa internacional Digital Global Overview Report, da DataReportal, divulgada no ano passado. “Se a média do brasileiro é uma das mais altas do mundo, a gente pode pressupor que a média dos jovens e da criança brasileira, é ainda maior. E isso começa a surgir como uma preocupação das escolas, das autoridades e até dos próprios jovens”, avalia.
Na visão do CEO da Nexus, a opinião pública favorável ao controle do uso dos celulares nas escolas reflete o avanço no entendimento coletivo sobre os riscos associados ao uso excessivo das tecnologias digitais, especialmente em um momento em que o desempenho acadêmico já sofre com os efeitos de uma transição massiva para o ensino remoto na pandemia. “O importante aqui não é que o brasileiro é contra o celular ou está demonizando as redes sociais. Não se trata disso, é um entendimento de que o uso indiscriminado do aparelho, não para atividade pedagógica, tem tirado a atenção das crianças e prejudicado o aprendizado”, avalia.
À medida que a renda ou a escolaridade dos entrevistados sobe, a aprovação a proibição do celular também cresce. Segundo o levantamento, quanto mais alta a renda, mais as pessoas são favoráveis à proibição: 67% da população com renda superior a cinco salários mínimos acreditam que os celulares deveriam ser totalmente proibidos. Na parcela da população com até um salário mínimo, 83% são a favor de algum tipo de restrição ao uso de celular nas escolas.
O mesmo acontece quando se avalia a escolaridade. Entre os entrevistados com ensino fundamental completo, a aprovação é 82%. Ela sobe para 87% no Ensino Médio e vai para 93% entre aqueles que tem ensino superior. “Isso indica que essas pessoas estão tendo mais acesso à informação. Há vários estudos divulgados recentemente sobre prejuízo do celular para as crianças e acho que isso foi formando nas pessoas essa opinião de quem é preciso algum tipo de medida para se combater o exagero no uso do celular”, analisa Marcelo.
Debate nacional
A proposta de restrição ao uso de celulares nas escolas, em discussão na Câmara dos Deputados, inclui proibições durante os intervalos e veda o uso para estudantes de até 10 anos. O projeto de lei (PL) 104/2015, aprovado pela Comissão de Educação em 30 de outubro, agora segue para análise conclusiva na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, embora ainda não tenha data para votação.
O texto proíbe o uso de celulares em todo o ambiente escolar para alunos da educação básica, fundamental e média, tanto em instituições públicas quanto privadas. Estudantes a partir de 11 anos poderão usar os aparelhos apenas em atividades pedagógicas, com autorização dos professores, ou em casos específicos de acessibilidade, como para alunos com deficiência que utilizam tecnologias assistivas. Se for aprovado na Câmara, o projeto será encaminhado para o Senado.
A lei, entretanto, não é novidade para os mineiros. Em Minas Gerais, uma normativa de 2018 já regula o uso de celulares nas escolas apenas para fins pedagógicos, embora na prática a realidade seja mais flexível.
Professores relataram dificuldades para aplicar a regra de forma rigorosa, devido à falta de diretrizes claras e ao temor de repreensões legais ao confiscarem os aparelhos dos alunos, sem o respaldo da Secretaria Estadual de Educação. Controlar o uso dos celulares frequentemente depende de acordos diretos com os estudantes, o que muitas vezes falha em conter o uso indevido.